sábado, 31 de dezembro de 2011

New Year's Eve


Esta semana fui ver o típico filme desta quadra, de nome New Year's Eve. Muitos dirão que estes filmes estão carregados de clichés (não o nego) e que algumas cenas finais deste são bastante irrealistas, mas independentemente desses esperados desfechos, estes filmes não deixam de ser motivadores e positivos, contagiando quem os vê com a alegria característica da época.
New Year's Eve é um filme razoável, que consegue alguns momentos de humor brilhantes.
Apesar dos habituais clichés há aqui algumas nuances bastante curiosas que dão um fôlego diferente a esta experiência cinematográfica.
Não é novidade nenhuma todas as resoluções, sonhos e objectivos que cada um de nós tem anualmente neste momento, bem como a mensagem principal ser sempre saúde, paz e amor. Parece tão banal, mas à medida que o ano vai passando parece ser tão difícil de pôr em prática. Viver em paz connosco e com os outros, viver plenos de amor por nós e pelos que nos rodeiam (o que inclui o chico-esperto que se atravessa na nossa frente, o azelha que teima em atrasar toda a gente ou o palhaço do impaciente atrás de nós) é um lugar-comum, mas não deixa de ser verdade. Até mesmo a saúde, embora nem sempre nas nossas mãos, não deixamos de ter impacto nela, seja no que comemos ou no exercício físico que fazemos (ou que dizemos sucessivamente que vamos fazer no início de cada ano). É urgente sermos mais gentis para connosco e para com os que nos rodeiam, mesmo que aparentemente as pessoas nos retribuam da pior forma possível. A delicadeza e a cortesia tornam o mundo um lugar muito melhor, tal como um sorriso consegue fazer maravilhas e iluminar mesmo os momentos mais negros.

Para que não nos deixemos cair no que Eugénio de Andrade descreveu:

"Passamos pelas coisas sem as ver
Gastos, como animais envelhecidos:
Se alguém chama por nós não respondemos,
Se alguém nos pede amor não estremecemos,
Como frutos de sombra sem sabor,
Vamos caindo ao chão, apodrecidos."

Também nas suas palavras:

"É urgente o amor.
É urgente um barco no mar.

É urgente destruir certas palavras,
Ódio, solidão e crueldade,
Alguns lamentos,
Muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
Multiplicar os beijos, as searas,
É urgente descobrir rosas e rios
E manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
Impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
Permanecer."

Esta época de balanço relembra-nos que a resiliência está dentro de nós e que tal como o ano se renova, também nós nos podemos renovar.
E é por isso que o discurso da personagem de Hilary Swank, embora aparentemente não traga nada de novo, não deixa de ser bom lembrar e relembrar.

A todos: um 2012 muito FELIZ!!!

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Always Like This


"Beauty of mine, sit before me. Let me peruse you and remember you... always like this."
Paul (Marlon Brando) - Ultimo Tango A Parigi

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

If Only


"If only you would have been born a man, what a Caeser you would have been."
Marcus Aurelius (Richard Harris) - Gladiator

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Cena do Circo em Big Fish

Uma das melhores cenas de cinema, nesse feérico e lúcido Big Fish, em que realidade e sonho parecem confundir-se, numa obra que nada mais é do que um hino à vida:

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Beleza Feminina


Há determinados realizadores que têm a capacidade de filmar a mulher duma maneira muito particular. Conseguem enaltecer os traços de cada protagonista feminina e conseguem criar todo um estilo de mulher que associamos de imediato aos filmes desse autor.
Poderia falar de Vadim, Hitchcock, Godard, Truffaut, Tornatore, Antonioni, Fellinni, Bergman; que directa ou indirectamente tinham uma forma peculiar de dar vida ao feminino no grande ecrã. Poderia mencionar tantos outros, mas vou apenas debruçar-me sobre três, do panorama actual, que a meu ver se excedem e se transcendem no acto de filmar este universo.

Começo por Woody Allen: amado por muitos, odiado por outros tantos; uma coisa é certa: Allen tem a capacidade de se debruçar desmesuradamente sobre o universo das relações humanas, particularmente no confronto homem/mulher. As suas protagonistas podem ter personalidades e estilos diversos, mas Allen filma-as com aquilo que parece ser um certo amor pela sua beleza, realçando particularidades de cada uma. Haverá alguém que pense em Mia Farrow ou Diane Keaton e não as imagine de imediato como Allen as filmou? Já nos mais recentes destacam-se Scarlet Johansson, bela por si só, mas que em Match Point é remetida ao patamar dos deuses, ou ainda Penelope Cruz, que (apesar da singularidade da personagem) não parece vulgar em Vicky Cristina Barcelona. Ou ainda tantas outras protagonistas como Rebecca Hall ou Marion Cotillard ou Rachel McAdams, das quais Allen retira da sua simplicidade imagens duma beleza etérea.

Depois, vem o meu preferido: Pedro Almodovar. Embora tenha falado anteriormente de Penelope, devo dizer que não gosto particularmente desta actriz e penso que o único que a filma de forma magistral é Almodovar. Penelope parece ganhar uma nova luz nos filmes deste mestre espanhol, quer em beleza, quer em talento. As suas curvas, as suas formas, a sua voz, o seu sotaque, os seus olhos, os seus lábios, toda ela parece respirar sensualidade nos filmes de Pedro (particularmente na obra-prima Los Abrazos Rotos, que passará esta sexta-feira na RTP2 na sequência do ciclo semanal de cinema dedicado a Almodovar, exibido neste canal). Este mestre espanhol é, a meu ver, a pessoa que mais consegue retirar dos seus actores. Qualquer personagem que Almodovar filma parece-me duma beleza infinita. Quer homens, quer mulheres parece que se revelam no olhar deste cineasta, passando muitos de larva a borboleta, tal é a capacidade de Almodovar sorver o melhor dos seus protagonistas e imagens. No mais recente La Piel Que Habito, Elena Anaya aparece deslumbrante e até mesmo Antonio Banderas parece rejuvenescer. Acho que a capacidade de filmar a beleza e trazer o melhor dos seus actores é uma característica intrinsecamente almodovariana, a qual enriquece as imagens que nos traz de forma soberba.

Por último, vem o mais marcante de todos: David Lynch. O universo de Lynch é muito sui generis e as suas protagonistas também. O realizador consegue captar um certo lado negro e uma beleza dramática de qualquer actriz que passe nas suas mãos. Laura Dern, Isabella Rosselini, Naomi Watts, Patricia Arquette e Laura Helena Harring (o que aconteceu a esta promissora actriz???) metamorfoseiam-se nas mãos de Lynch. Dern é a musa mais querida, aquela que mais povoa o imaginário lynchiano. Watts foi descoberta nesse magnífico e enigmático Mulholland Drive, sendo hoje em dia uma das mais talentosas e camaleónicas actrizes de Hollywood. E, talvez à excepção desta última, sempre que pensamos na beleza duma das outras mulheres, são as imagens de Lynch que nos assaltam.

Filmar é uma arte. Há imagens que marcam e há protagonistas femininas que associaremos de imediato a um determinado estilo de realização, pela notável maneira de memorizar a beleza duma mulher, numa tela para a posteridade.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

The More You Know



 "The more you know who you are, and what you want, the less you let things upset you."
Bob Harris (Bill Murray) - Lost In Translation

domingo, 25 de dezembro de 2011

Dead Poets Society




Um dos melhores filmes que vi, um dos melhores livros que li.
Esta obra recupera de forma intensa a inocência da juventude, com todos os seus sonhos, angústias e dúvidas.
É uma obra maior porque mostra a importância que o exemplo tem no imaginário juvenil. O professor é um ser extraordinário por poder inspirar pessoas, moldando-lhes ideias e visões. O Professor pode inspirar cada um a pensar, a descobrir-se a si próprio, a explorar cada recanto de si, de modo a poder aceder às ferramentas de gestão do seu próprio ser.
Um leque de jovens e talentosos actores, encabeçados pelo Captain Robin Williams dão vida a uma das mais belas histórias de sempre, tendo como base a poesia.
As palavras têm uma força desmesurada (sobretudo na idealista mente da juventude) e a poesia é a maneira de “morder como quem beija”. É o modo de dizer de forma bela o que é vulgar ou expor de forma simples o que parece inexplicável. É a delícia dos olhos, o deleite da boca, o delírio dos ouvidos. Ou nas magníficas palavras que dão início a Folhas Caídas de Garrett (que li quando tinha a idade dos protagonistas do filme e, tal como eles, fiquei maravilhada pela magia da poesia):

"O meu deus desconhecido é realmente aquele misterioso, oculto e não definido sentimento de alma que a leva às aspirações de uma felicidade ideal, o sonho de oiro do poeta.
Imaginação que porventura não se realiza nunca. E daí quem sabe? A culpa é talvez da palavra, que é abstracta de mais. Saúde, riqueza, miséria, pobreza, e ainda coisas mais materiais, como o frio e o calor, não são senão estados comparativos, aproximativos. Ao infinito não se chega, porque deixava de o ser em se chegando a ele.
Logo o poeta é louco porque aspira sempre ao impossível. Não sei. Essa é uma disputação mais longa.
Mas sei que as presentes Folhas Caídas representam o estado de alma do poeta nas variadas, incertas e vacilantes oscilações do espírito, que, tendendo ao seu fim único, a posse do ideal, ora pensa tê-lo alcançado, ora estar a ponto de chagar a ele - ora ri amargamente porque reconhece o seu engano - ora se desespera de raiva impotente por sua credulidade vã.
Deixai-o passar, gente do mundo, devotos do poder, da riqueza, do mando, ou da glória. Ele não entende bem disso, e vós não entendeis nada dele.
Deixai-o passar, porque ele vai onde vós não ides; vai, ainda que zombeis dele, que o calunieis, que o assassineis. Vai, porque é espírito, e vós sois matéria.
E vós morrereis, ele não. Ou só morrerá dele aquilo em que se pareceu e se uniu convosco. E essa falta, que é a mesma de Adão, também será punida com a morte.
Mas não triunfeis, porque a morte não passa do corpo, que é tudo em vós, e nada ou quase nada no poeta."


“I went to the woods because I wanted to live deliberately,
I wanted to live deep and suck out all the marrow of life,
To put to rout all that was not life and not when I had come to die
Discover that I had not lived.”

É o trecho que inicia cada sessão do Clube que dá nome ao filme, Clube esse que ao qual todos almejamos pertencer, essa intrínseca necessidade de pertença juvenil.
E estes versos de Thoreau exprimem de forma singular essa busca pela liberdade e a verdade, que se procura, sobretudo, quando se é jovem e se acredita em ideais e os sonhos ainda não foram desmistificados pela máquina. Apenas a natureza consegue restituir essa pureza de espírito, daí os versos serem tão vivos.
Uma ode à poesia e à vida.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Must Be A Great Confort



"A man can lie, steal... and even kill. But as long as he hangs on to his pride, he's still a man. All a woman has to do is slip - once. And she's a "tramp!" Must be a great comfort to you to be a man."
Vienna (Joan Crawford) - Johnny Guitar

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Lost In Translation


A primeira vez que vi este filme, foi numa sessão de cinema, tinha eu dezanove aninhos. Nunca mais voltei a vê-lo e apesar de todos os elogios, resistia-lhe, porque essa primeira vez me havia deixado um gosto amargo na boca. A verdade é que o nosso estado de espírito tem tanta influência no que vemos, como o que vemos tem no nosso estado de espírito.
If you’re feeling stuck, the movie will suck.
Por diversas vezes pensei neste filme, mas a coragem (ou vontade) de o ver de novo faltava-me e foi numa decisiva conversa recente que me decidi oferecer a mim mesma esta experiência.
Revi-o esta semana e este é sem dúvida uma das melhores obras de cinema contemporâneo. A mestria e precisão de Sofia Coppola, sobretudo na junção entre imagens e som, bem como o talento dos actores dão luz a um dos projectos mais lúcidos que já vi. Diz-se tudo sem palavras.
O espanto que Bill Murray sente é não só compreensível como expectável, sobretudo para quem já esteve do lado de lá.
O inconformismo que Scarlet Johanson sente é uma realidade corrente no imparável mundo actual.
A solidão e desencanto que ambos sentem é apenas o reflexo do inevitável conflito que a passagem do tempo provoca.
Às vezes questiono-me o que se passa do outro lado do mundo. Quão diferentes são as vidas que as pessoas vivem.
É no silêncio que a proximidade nasce. E é neste lost in translation que nos sentimos todos no incessante burburinho diário.

domingo, 18 de dezembro de 2011

The English Patient



Lembro-me perfeitamente de ver o cartaz deste filme em exibição no cinema e de escolher não o ir ver (esta escolha é das decisões que mais lamento e ainda tenho esperança de poder desfrutar esta obra colossal no grande ecrã). Tinha eu, à data, treze anos anos e achava que aquilo seria uma lamechice pegada. Santa ignorância! The English Patient é, não só, o filme da minha vida, como uma das obras maiores do cinema.
Quer as imagens de infinita beleza, quer a excelência do elenco, quer a magnifica banda sonora, quer a suprema realização, quer o refinado argumento contribuem para fazer desta uma das obras mais memoráveis da sétima arte.

A história passa-se em dois momentos distintos: o que foi e o que é. A memória dá vida a alguns dos momentos mais grandiosos do filme e o dia-a-dia do presente revela-se encantador nos pequenos tudo-nada diários, sendo desses mesmos instantes que nascem os momentos memoráveis.

Frequentemente esquecemo-nos dessa realidade: que são as pequenas insignificâncias no seu conjunto que dão vida a algo maior do que a vida. E é do mais improvável que nasce a intensidade feroz que nos assola e transforma. Deixamos de ser o que éramos outrora para nos tornarmos outro ser, mas sem nos apercebermos dessa mudança. É dessa improbabilidade e desses pequenos momentos que nascem os laços mais fortes e duradouros.

K cede; aliás K procura o perigo. Ou seria inevitabilidade? Porque depois daqueles olhares se cruzarem poderia ser de outra forma? Mas o perigo sufoca, porque os afectos são livres, mas o mundo não é. Porque os afectos são verdadeiros, mas há situações que não podem coexistir (pelo menos não por muito tempo) sob pena de desgastarem tudo o que lhes está associado.
Almasy não gosta de pertenças (daí a liberdade dos afectos), mal ele sabia que nesse momento já havia algo intrínseco a si próprio; algo que demonstra que a pertença é natural e inevitável, talvez até desejável. É algo que representa a própria liberdade suprema do motivo que lhe dá origem. É algo incontornável porque "the heart is an organ of fire".


Almasy não compreende, como é compreensível, a atitude de K. Acha, talvez, que isso espelha a ausência do que achava que existia.
“How can you stand there? How can you ever smile as if your life hadn’t capsized?"
-         "Do you think you’re the only one who feels anything? Is that what you think?”

Heródoto – o pai da História – é testemunha daqueles afectos, como o são, tantos outros seres ausentes e, no entanto, tão presentes na vida dos que amam. A música é uma das maiores testemunhas, tendo Almasy o dom de cantar tudo a toda a hora e saber as letras todas de cor.
“Actually you sing. You sing: all the time.” 
“Is there a song you don’t know?”
É também durante uma música particular de título “Where or When” que Almasy parece invadir K com o seu olhar penetrante. E é ao som de “Cheek to Cheek” que acontece uma das melhores cenas da história do cinema.
E os acordes das músicas de Yared testemunham a inesquecível visita à igreja, a materialização do amor no almoço de Natal, o apoteótico percurso com K no colo (no qual ela revela o que Almasy duvidava) ou as vozes de duas actrizes naquele que é o culminar do filme, nessa visão pura e realista do que são os países, os medos, os afectos, a luz, a vida, o palácio dos ventos ou a quimera do encanto entre mar e céu, na linha do horizonte.




"My darling: I'm waiting for you. How long is a day in the dark? Or a week? Fire is gone now, and I'm cold, horribly cold. I really want to drag myself outside but then there'd be the sun. I'm afraid I waste the light on the paintings and on writing these words. We die. We die. We die rich with lovers and tribes, tastes we have swallowed, bodies we have entered and swum up like rivers. Fears we've hidden in - like this wretched cave. I want all this marked on my body. We’re the real countries. Not the boundaries drawn on maps with the names of powerful men. I know you'll come and carry me out into the Palace of Winds. That's all I've wanted: to walk in such a place with you. With friends. An earth without maps. The lamp has gone out and I'm writing in the darkness."

É de afectos que somos feitos: é por eles e para eles que vivemos.
E em última instância: haverá outro sentido para tudo a não ser esse?


O melhor filme de sempre!

sábado, 17 de dezembro de 2011

Bigger Than Life

"Acting should be bigger than life. Scripts should be bigger than life. It should all be bigger than life."
Bette Davis

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Johnny Guitar



Depois de ver o filme fiquei com a estranha sensação do nome ser desajustado à película. E tenho a certeza que depois de o verem, muitos sentiram o mesmo.
Nunca simpatizei com Joan Crawford, ou melhor, nunca me interessei mais por esta talentosa e enigmática actriz dos anos dourados. Penso que tal se deve à minha enorme devoção por Bette Davis e sendo as duas grandes rivais, nem mesmo esse magnífico confronto de gigantes que é Whatever Happened To Baby Jane me deu vontade de explorar mais esta grande senhora.
Algumas palavras sobre este filme e uma tarde desocupada foram o mote necessário para visualizar finalmente esta película. Já lá vão uns meses, mas a sensação que tive no final do filme continua presente.
Trata-se duma obra grandiosa de Nicholas Ray passada no faroeste, com homens de pistolas em punho e mulheres tremendamente fortes. Aliás, embora se pense que os durões deste tipo de filmes são os homens, a verdade é que as verdadeiras heroínas são as mulheres, seres duma força que resiste a tudo. E a verdade é que estes filmes não estão assim tão longe da realidade, afinal são as protagonistas femininas os seres de garra do dia-a-dia, os seres de verdade, os seres de coragem, os seres sem medo, os seres inconformados, os seres decisores. Esse ser é particularmente carismático na pele de Crawford, a verdadeira estrela do filme. É no seu olhar atormentado e todavia esperançoso que nos revemos. É na sua resiliência em que queremos acreditar. É do seu olhar e da sua voz que são concebidos os melhores momentos desta obra, sobretudo no confronto com o Johnny que dá nome ao filme, confronto esse que espelha a célebre frase de Vinicius: “a vida é a arte do encontro, mas há tanto desencontro por aí”.
E o tempo perdido é sempre irrecuperável.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Would You See Then


"What if I were smiling and running into your arms? Would you see then what I see now?"
Christopher McCandless (Emile Hirsch) - Into The Wild

domingo, 11 de dezembro de 2011

Drive



"Fui ver o Drive, do dinamarquês Nicolas Winding Refn, protagonizado por Ryan Gosling, contando também com Bryan Cranston (que nunca – nunca – desilude).

Inicialmente, Hugh Jackman foi escolhido para o papel principal. Mas, depois, a personagem foi entregue a Gosling.
Neil Marshall ia realizar. Mas, depois, Gosling “hand-picked” Nicolas, o dinamarquês.
E tudo teria sido diferente.

A expectativa era elevada: 8.2 no IMDb e a crítica aclamar a prestação de todos os envolvidos, à frente e atrás das câmaras. Porém, não estava preparada para aquelas duas horas, em que apenas o enredo é simples e algo linear. 
Os planos, os ângulos, e as cores nas suas diferentes tonalidades são bonitos – bonitos, sim.
A luminosidade nas cenas de exterior e o brilho da noite de L.A..
O detalhe da variação da iluminação no elevador.
As sequências de acção, as fugas de carro, a perseguição.

A banda sonora – retro, electrónica, poderosa, ajustada ao momento, ocupando o lugar de tantas linhas de guião. Merecedora de um lugar na nossa estante de de CDs. Mas em vinil é que era!

Tudo é intenso e tudo é equilibrado.
Percebemos que é uma história de amor, por uma mulher e seu pequeno filho, porque o é. Mas também é uma tragédia, um resgate, uma vingança, uma luta pela vida. Um herói caído.

E depois há as personagens. Todas elas com histórias complexas.
O velho mecânico e o seu jovem e talentoso protegido aparentemente desenraizado, o mafioso judeu que só se quer integrar, a mãe que se apaixona enquanto o seu marido cumpre pena, e o mesmo marido que nos conduz ao ponto de viragem do rumo de todos.
É em Driver, personagem central e sem nome, que encontramos a grandiosa sinergia entre um actor e o seu director.
Sabemos desde os primeiros segundos do filme que Driver está ligado ao mundo do crime.
Fala pouco, diz apenas o necessário. Fascina-nos a sua precisão, astúcia e inteligência. Apercebemo-nos da sua solidão. Vemos o amor a acontecer. Criamos empatia.
Não nos choca a serenidade com que diz a um visitante do passado “shut your mouth or I'll kick your teeth down your throat and I'll shut it for you”.
Consideramos legítimos os crimes que comete – afinal, só queria salvar-se e salvaguardar o bem-estar dos objectos do seu afecto.
Compreendemos. Tudo o que aconteceu foi necessário. É um herói.
O Wikipedia classifica-o como “crime neo-noir drama film”.
Eu considero-o apenas um filme a não perder, e a rever. Um 4 em 5."

Isabel Sofia

sábado, 10 de dezembro de 2011

Dial M For Murder



Este filme é muito especial porque foi o primeiro filme de Hitchcock que vi. Escusado será dizer que a este se seguiram uma catrafada de outros, porque fiquei completamente rendida ao estilo do realizador. 
O policial quando bem trabalhado é um exercício de inteligência. Há poucos mestres cinematográficos dentro do género e pode-se dizer que Hichcock é um dos mais emblemáticos portadores deste título.
Nunca me esqueci da maneira elegante como a trama é desenvolvida e como toda a acção do filme tem lugar no mesmo compartimento, não deixando por isso de ser menos emocionante ou apetecível. Pelo contrário: apenas no final do filme me apercebi de tal facto.
A premissa de “marido quer matar mulher para herdar herança” já foi batida e rebatida, mas esta película possui uma das histórias mais bem desenvolvidas de sempre.
Foi também a primeira vez que vi essa senhora de grande classe a representar e naturalmente a minha mente jovem e cheia de sonhos ficou fascinada com a sua elegância.
(À medida que fui vendo mais filmes do mestre compreendi que Grace Kelly seria o tipo de presença assídua: uma mulher de beleza clássica e ar gélido, atrás do qual se escondem as forças mais ocultas e inesperadas. Todas as suas protagonistas representavam este ideal feminino, nomeadamente a talentosa Tippi Heddren e a surpreendente Kim Novak. Outra presença recorrente era o tipo alto, elegante, calmo e inteligente, recorrentemente interpretado por James Stewart.)
É surpreendente o que um bom argumento e actores bem dirigidos conseguem originar.
A maravilha deste tipo de filmes é a sua intemporalidade, tão actual ontem, como hoje: Dial M For Murder ou no (igualmente notável) título português Chamada Para A Morte é uma das melhores obras do género.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Anonymous



Este filme vem trazer um novo olhar sobre quem seria esse grande dramaturgo e poeta que delicia a Humanidade com as suas palavras.
A força das palavras é bem mais forte do que muitas vezes se imagina. A palavra certa no momento certo tem um poder desmesurável, pois é delas que nasce a acção.
O poeta é um ser superior na medida em que consegue expressar-se a cantar. Brinca com as palavras e em vez de falar cria delícias para os ouvidos, sonhos para os sentidos. Parafraseando a Hypatia de Agora: I believe in poetry.
Escrever e publicar, algo aparentemente tão fácil para qualquer um com acesso a computador, era moroso e não tinha a grandeza que hoje se lhe atribui. A escrita, particularmente a poesia, foi (à semelhança de muitas outras artes) a herdeira de muitos pais desafortunados, que muito por ela se bateram (tal como Sade no belíssimo Quills, sobre o qual nos debruçaremos um dia destes). 
Shakespeare, fosse ele quem fosse, foi um desses progenitores.
Infelizmente, embora a história que o filme nos traz seja interessante, perde-se no meio de intrigas, tragédias e personagens incompletas e algo inverosímeis. Não tenho dúvidas de que Shakespeare seria alguém pertencente a uma classe elevada, devido à cultura espelhada nas suas obras; tal como não tenho dúvidas relativamente a perpetuidade e continuidade dos seus versos, enquanto houver vida. Mas duvido da capacidade deste filme encantar os espectadores.
Shakespeare merecia mais.

Habemus Papam



Poucas coisas são tão privadas e intransmissíveis como a fé. Por essa razão é tão difícil fazer um filme sobre um tema tão delicado.
Habemus Papam é mais uma belíssima obra com que Moretti nos brinda.

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

The Mirror Of The World

"Although for some people cinema means something superficial and glamorous, it is something else. I think it is the mirror of the world."
Jeanne Moreau

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Ordet



Já me haviam falado muito deste filme. Falaram-me duma cena em particular, por diversas vezes - cena essa duma elevada grandeza – e a curiosidade ditou que visse o filme.
Ordet ou em português A Palavra é um filme feito de momentos de elevada grandeza. Trata-se duma película dinamarquesa, realizada por Carl Theodor Dreyer. Devo dizer que este filme me fez lembrar imenso de Bergman, quer pela temática, quer pela maneira de filmar, embora tal possa ser dúbio visto que este é o primeiro filme de Dreyer que vi e não vi assim tantos de Bergman.
A Palavra está carregado de tudo o que toca a Humanidade: fé, amor, loucura, ódio, sanidade, vida, morte. E mais do que qualquer outra coisa: medo. Medo esse que só a inocência parece capaz de colmatar.
É um filme que para além de nos relembrar a nossa pequenez, relembra-nos a nossa grandeza. Inventamos a arte, a ciência, a tecnologia, tudo com o fim último de nos eternizarmos. De todos os meios, é, sobretudo, através da arte que tentamos preservar a memória. E o cinema é o maior veículo do eterno. E a cena de que me falavam é, por essa razão, tão especial. Porque só o cinema poderia eternizar algo que, dada a época e o contexto, não tinha forma de permanecer connosco, a não ser através da memória.
O amor e a morte são o centro do filme: quer na alma, quer na carne.
Há uns anos morreu um grande amigo meu. Recordo-me, particularmente, de algo que foi dito na sua despedida: “Este é o dia mais feliz na vida do…” Aquelas palavras ficaram, ecoam como se as estivesse a ouvir agora. De facto, esse momento é inevitável para todos e, desde que nascemos, caminhamos para esse dia. A morte é temida por ser irreversível e por afastar pessoas que se amam. Mas é ela que diviniza a vida. Será, então, o culminar da nossa existência? Se a resposta existe, certamente não estará na palavra.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Did I Ever Tell You


"Did I ever tell ya that this here jacket represents a symbol of my individuality, and my belief in personal freedom?"
Sailor Ripley (Nicolas Cage) - Wild At Heart

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A Dangerous Method



Cronenberg é um realizador muito particular. Os seus filmes possuem traços estranhos, nem sempre apreciados pelo público em geral. Este não é excepção. Trata-se dum filme singular, nomeadamente pelas pessoas sobre as quais se debruça e tão ou mais importante, as ideias defendidas por essas mesmas pessoas.
O leque de actores deste filme é brilhante. Temos o, já habitual nas obras de Cronenberg, Viggo Mortensen, que mais uma vez desempenha um papel com o seu nível de excelência. Desde A History Of Violence, passando por Eastern Promisses, esta colaboração entre actor e realizador tem vindo a tomar lugar de forma bastante frutífera. Temos também uma repetição do elenco de Eastern Promisses, noutro excelente actor de nome Vincent Cassel. Depois temos uma actriz da qual nunca gostei particularmente, mas devo dizer que a sua prestação neste filme me convenceu: Keira Knightley. Acho que o trabalho desenvolvido nesta película é de elevada qualidade e atrevo-me a afirmar que poderá originar muitos prémios. E, por último, temos ainda a magnífica interpretação de Michael Fassbender, um actor que se tem vindo a revelar cada vez mais e mais talentoso.
Para além deste rico leque de actores, as personagens que cada um interpreta conferem de imediato uma certa grandeza e curiosidade ao filme. Assim, cada um deles representa, respectivamente, Sigmund Freud, Otto Gross, Sabina Spilrein e Carl Jung.
A história é bastante interessante e está muito bem desenvolvida ao longo da película. Não será de estranhar que tal conjunto de personagens se debruce sobre a sexualidade e todos os meandros psicológicos associados à mesma. Deveremos de facto ceder ao desejo, em toda e qualquer circunstância, como algo natural, como defende Gross? Ou deveremos, como seres racionais, em sociedade, reprimir certas e determinadas vontades, conforme se questiona Jung? Estará a sexualidade reprimida por trás de cada um dos nossos sonhos e pensamentos inconscientes, como parece acreditar Freud? Ou haverá outras razões subjacentes às dúvidas e angústias da nossa mente? Será que o acto sexual é simultaneamente criador e destruidor, conforme defende Spilrein? Estaremos condenados, como seres pensantes em sociedade, a reprimir as nossas vontades? Ou fazemo-lo não por necessidade social, mas por uma necessidade interior?
Mais importante do que revelar e debater todas estas questões, é o passo que cada uma destas pessoas deu no sentido de compreender as razões por detrás das mesmas. E é na ligação e confronto entre pessoas e ideias que nos revelamos e compreendemos a nós próprios. E a compreensão será, possivelmente, o primeiro passo para a libertação.

O Refúgio

Grande parte da magia do cinema vem de mostrar, sobretudo, a grandiosidade em todo o seu esplendor.
Mostrar cada pormenor e eternizá-lo para sempre na tela e, consequentemente, na memória de quem o testemunha é um acto de magia. Não é a toa que se dizia que os actores são feitos da mesma matéria de que são feitos os sonhos.
E, mais do que eternizar o momento, o cinema tem a particularidade de deixar para o imaginário muitas coisas, nomeadamente o tempo, que parece voar, ou o dia-a-dia rotineiro dos protagonistas, que parece ser inexistente, ou ainda o resto da história, que após a resolução, parece ser de eterna felicidade.
Para além de todos estes pontos, o cinema tem ainda outro factor essencial que contribui para a sua magia o The End no final da película. Embora, agora já em desuso, o The End está sempre subjacente à experiência duma película, que tem delimitação no tempo. Sabemos que vai sempre acabar e sabemos como terminou. Podem ficar variantes por decidir e que podemos debater até à exaustão, mas o todo está lá. Não se pode acrescentar ou retirar nada e essa terminação dá-nos um certo conforto.
Embora, o cinema seja uma imitação da vida, esse conforto cinematográfico apenas surge na vida real quando a história também termina. Só que até a história terminar há imensos, mais do que muitos, momentos banais que o cinema não capta. E, daí o cinema nos parecer tão perfeito e encantador, e a vida muitas vezes insípida e imperfeita.
E é por essa razão que o cinema é o refúgio por excelência. É esta a magia do cinema: resumir a vida aos momentos que marcam a memória.

sábado, 26 de novembro de 2011

Most Totalitarian Of The Arts

"Cinema is most totalitarian of the arts. All energy and sensation is sucked up in the skull, a cerebral erection, skull bloated with blood. Caligula wished a single neck for all his subjects that he could behead a kingdom with one blow. Cinema is this transforming agent. The body exists for the sake of the eyes; it becomes a dry stalk to support these two soft insatiable jewels."
Jim Morrison

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Into The Wild



O que leva alguém a deixar tudo para trás e enveredar pelo desconhecido?
Antes da obra-prima cinematográfica que Sean Penn criou, quero dizer umas palavras sobre a obra-prima literária que Krakauer concebeu: Into The Wild é um livro intenso, que prende desde a primeira palavra. Retrata a história de Christopher Johnson McCandless, intercalada pelos próprios pensamentos e experiências do autor relativamente à incessante busca da liberdade e verdade, que só a natureza parece aplacar.
Sean Penn realizou um filme marcante, com a sólida e brilhante presença de Emile Hirsch como jovem protagonista.
McCandless iniciou esta aventura em 1990 e em dois anos percorreu grande parte dos Estados Unidos da América e toda a zona ocidental do Canadá, rumo ao Alaska”. Em Maio de 1992, quando chegou ao destino que seria sua casa durante cerca de 112 dias, escreveu: “Two years he walks the earth. No phone, no pool, no pets, no cigarettes, ultimate freedom. An extremist. An aesthetic voyager whose home is the road. Escaped from Atlanta. Thou shalt not return, ‘cause “the west is the best”. And now after two rambling years comes the final and greatest adventure. The climatic battle to kill the false being within and victoriously conclude the spiritual revolution. Ten days and nights of freight trains and hitchiking bring him to the great white north. No longer to be poisoned by civilization he flees, and walks alone upon the land to become lost in the wild”, assinando como Alexander Supertramp, um dos vários nomes que assumiu ao longo da viagem.
Esta história inspiradora, frequentemente criticada pela sociedade, não deixa de ser intrigante em toda a sua magnitude. McCandless teve a coragem de fazer algo completamente invulgar, fugindo às regras ou padrões impostos pela sociedade e, mais importante, algo em que acreditava profundamente. Teve a coragem de ser egoísta e viver por e para si.
E a questão surge naturalmente: o que leva alguém a deixar tudo para trás and walk into the wild? Com certeza já todos pensámos nisto mesmo, mas onde está a ténue fronteira que separa o pensamento do efectivo passo?
 A apaixonante história de McCandless é retratada de forma realista, sólida e segura, ao som duma das melhores bandas-sonoras de todos os tempos, interpretada por Eddie Vedder: as imagens e a música fundem-se de forma perfeita.
Num dos livros, que levava consigo, sublinhou o seguinte: “Rather than love, than money, than fame, give me truth. I sat at a table where were rich food and wine in abundance, an obsequious attendance, but sincerity and truth were not; and I went away hungry from the inhospitable board. The hospitality was cold as the ices.” Henry David Thoreau – Walden or Life In The Woods
A busca de McCandless pela liberdade e, acima de tudo, pela verdade é uma inspiração para todos os que nas palavras de Tennesse Williams se encaixam em: “A prayer for the wild at heart, kept in cages.”

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Fight Club



Este filme foi como um murro no estômago. Devia ter uns 15 anos quando o vi pela primeira vez e devo dizer que os efeitos que este filme tem no imaginário da juventude é brutal. Quase que posso dizer que a minha vida nunca mais foi a mesma.
Who the fuck was Tyler Durden e porquê esse desapego total às grilhetas impostas pela sociedade? Porquê essa recusa em viver como mais um? Porquê a inaceitação do pré-definido e estabelecido, como algo intrínseco e correcto para nós próprios?
Era óbvio, após experienciar este filme, que tínhamos (temos) de nos questionar sobre todo e qualquer assunto, sempre e em todas as circunstâncias.
Era óbvio que vivíamos numa sociedade consumista, em que todos (todos, sem excepção) somos escravos do dinheiro. Faz parte da grande máquina em que estamos inseridos. E ou aceitamos isso ou vivemos à margem da sociedade, como fazia Tyler Durden (talvez por isso tão admirável e inspirador) que se refugiava num movimento criado por si, que origina o Fight Club do título.
Para além de todas as questões que o filme levantava e toda a inspiração que advinha da admiração da atitude do protagonista, o final do filme era apoteótico. Era como se abríssemos os olhos a um universo completamente novo, no qual nunca havíamos realmente parado para pensar e do qual continuaríamos (continuaremos) alheios a maior parte do tempo em que somos empurrados, levados, consumidos pela máquina.
O trio de actores havia sido impecavelmente escolhido e o realizador de Seven e de The Game excedia os trabalhos anteriores extravasando, de longe, as expectativas. David Fincher revelava-se um mestre.
Dizem que não há vez como a primeira e, de facto, tal aplica-se na perfeição a esta obra. Podemos rever este filme, mas o impacto que a primeira vez provoca nas entranhas é bastante superior e muito mais intenso do que qualquer uma das seguintes. 

terça-feira, 22 de novembro de 2011

In The Morning


"Every night I cut out my heart. But in the morning it was full again."
Conde Lazlo de Almasy (Ralph Fiennes) - The English Patient

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Mar Adentro



Recordo este filme por contar a tocante e verídica histórica de alguém que deseja morrer, sendo que o mundo (ou a civilização) o impede de tal.
Na civilização ocidental a morte é vista, com frequência, como algo temível, assustador e indesejável. De facto, a morte traz consigo a ausência de alguém e, consequentemente, os sentimentos de dor associados a essa perda. As pessoas vivem agarradas a tudo o que têm, inclusivamente aos outros e a si próprias. Este apego gera uma angústia (elevada) face à inevitabilidade dum acontecimento irreversível. Ou nas palavras duma grande amiga minha: “as pessoas preocupam-se tanto em não morrer, que nem querem saber como vivem”.
O mal-estar gerado por este acontecimento é quase igualado pelo debate do mesmo. Desejar morrer é algo inaceitável numa sociedade que preza a vida como razão última. Recordo um momento do filme em que o pai do protagonista afirma: “pior do que ter um filho morto, é ter um filho que quer morrer”.
O direito à escolha deveria ser um bem essencial numa sociedade evoluída e livre.
A principal dificuldade, no que a este assunto diz respeito, é definir quais as “regras” que serão válidas para uma ou outra situação. Trata-se dum assunto melindroso e exaustivo e, também talvez por essa dificuldade, ainda não se tenha avançado mais neste campo.
Mas o direito a morrer e, consequentemente, a escolher condignamente a vida que se vive não deveveria ser um dos assuntos mais prementes a decidir?
(Nota: trata-se dum belíssimo filme em que a corajosa história de Ramon Sampedro é contada de forma comovente por Alejandro Amenábar e interpretada de modo magistral por Javier Bardem.)

sábado, 19 de novembro de 2011

La Piel Que Habito


Há pessoas que são génios nas respectivas áreas de actuação. É o caso do Sr. Almodovar no que toca à sétima arte.
Amodovar tem o dom de surpreender e exceder-se a cada nova película.
Esta não é excepção. La Piel Que Habito é um dos filmes mais singulares dos últimos anos.
Para além deste dom, Almodovar tem a capacidade de filmar os seus actores e actrizes duma forma única. Todos os personagens almodovarianos possuem particularidades que os tornam belíssimos. Elena Anaya está absolutamente deslumbrante e Banderas parece que se revigorou nesta película. Não sou capaz de me recordar da última vez que o vi, mas parece-me que ganhou anos de vida neste filme, tudo graças à precisão deste realizador ímpar.
É impossível descrever La Piel Que Habito. É uma experiência arrebatadora que cada um deve provar logo que possa, num cinema perto de si.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

The Ides Of March


Não é segredo que nos últimos anos os filmes feitos por ou com George Clooney são dum elevado interesse cultural. Mesmo para quem não seja particularmente fã do senhor (como é o meu caso) há que admitir que parece que ele nasceu para este tipo de papel e a sua apetência por filmes que abordam assuntos complexos e controversos transmite-se nas sucessivas apostas que tem feito.
The Ides Of March é mais um brilhante desafio no que concerne os meandros políticos e as entranhas humanas.
Para além de Clooney, o elenco é duma excelência elevada. Quer Paul Giamatti, quer Philip Symour Hoffman são dois actores geniais. E Ryan Gosling afirma-se mais uma vez como um dos melhores actores actuais. É Gosling que transporta o filme às costas; é no seu olhar que nos colocamos e nos revemos; é, aliás, no seu olhar (vincadamente diferente ao longo da película) que residem alguns dos melhores momentos.
Tive um Professor que dizia que “todos temos um preço”. Desengane-se quem pensa que não se inclui nesta afirmação, porque, efectivamente, todos temos um preço. Pode não se traduzir num valor monetário, mas numa crença ou ente querido; mas em última instância há sempre algo que não estamos dispostos a perder ou a abdicar.
Esta película demonstra de forma magistral o teor desta afirmação e o que pode acontecer quando as regras do jogo se invertem, ou quando somos apanhados num jogo que não queríamos (ou não estávamos aparentemente preparados para) jogar.
Um dos melhores filmes dos últimos tempos. Imperdível!


segunda-feira, 14 de novembro de 2011

In Time




Vi este filme no dia de estreia (passada quinta-feira) e devo dizer que a premissa é bastante aliciante: num futuro (não muito distante) as pessoas vivem até aos 25 anos, ano a partir do qual a sua aparência não se altera e possuem apenas um ano de vida. Assim, todo o seu trabalho, todos os seus bens essenciais, todo o trading é realizado em tempo. As pessoas compram e vendem horas de vida para (sobre)viver.
Tendo em conta o ritmo de vida do mundo actual, esta temática não podia ser mais certeira para “os tempos que correm”. De facto, o tempo corre e nós corremos cada vez mais atrás dele. Trocamos horas de vida por um salário que nos permita viver confortavelmente, como gostamos de pensar. Assim, em última instância, o ideal será trocar horas de vida por algo em que acreditemos (façanha nem sempre possível no tempo presente).
Há quem diga que existem dois dramas do tempo moderno: a questão do tempo a menos e a problemática do tempo a mais.
Eu acho que o tempo nunca é demais. Simplesmente fomos criados e educados a um ritmo louco, em que possuir horas de vida para o dolce fare niente passam de sonho a pesadelo, de desejo a maldição, porque não fomos preparados para lidar com a abundância de tempo; apenas com a sua escassez.
O próprio filme demonstra que tempo a mais pode bem ser a pior praga que assola o ser humano - afinal é a irrepetibilidade e unicidade de cada momento que tornam a vida tão especial. No entanto, o ser humano tem tendência para buscar repetidamente a eternidade em cada coisa que faz.
Por muito tempo que tenhamos (ou que pareça que temos) verificamos (ou verificaremos) que se trata apenas duma ilusão que passa com brevidade, com a certeza de que nada permanece; sobretudo o tempo.


terça-feira, 8 de novembro de 2011

Monólogo ou Diálogo com a Morte em O Sétimo Selo

O Sétimo Selo (Det Sjunde Inseglet) de Ingmar Bergman é um dos melhores filmes que já vi.
Esta cena é, particularmente, marcante.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

The Bridges Of Madison County


Um dos mais belos filmes que já vi.
O gigante Clint Eastwood encontra a divina Meryl Streep (possivelmente, a melhor actriz de todos os tempos) num melodrama de dimensão mítica.
O filme mostra os momentos que marcam uma vida. Mostra a plenitude. Mostra o momento do desespero da abdicação. Mostra o momento da angústia da aceitação. Mostra o momento de não retorno.
Mas não mostra todo o processo de readaptação que cada um tem de passar, para se voltar a inserir numa realidade mais pobre, amarga e sombria. (Não que a realidade não houvera sempre sido a mesma, mas depois de determinadas vivências, aquilo que tínhamos como felicidade ou normalidade, parece-nos agora mais pobre, mais triste em contraste com os momentos que lhe precederam.) Não mostra a vida que fica após uma existência momentânea, mas esplendorosamente intensa. Não mostra as pequenas lutas diárias ao longo da sinuosa estrada da abdicação e da aceitação. Não mostra o após.
É esta a verdadeira magia do cinema, apenas mostrar a grandiosidade.

sábado, 29 de outubro de 2011

Wall Street



Será que a ganância compensa?
Frequentemente se disse da religião ser o ópio do povo (citando Marx) e, sendo tal certo, não é menos verdade que o dinheiro é o motor do povo. Somos seus escravos desde o dia em que nascemos.
Esta excelente película aborda de forma sólida e coesa a insaciável busca de dinheiro. Conforme refere Michael Douglas na soberba interpretação de Gordon Gekko: “greed is good”. Mais do que ser ganancioso, o mote do filme debruça-se sobre uma outra necessidade: ser egoísta. É, acima de tudo, esse o ensinamento que Douglas parece transmitir a um jovem Charlie Sheen. Terá Gekko razão?
Nos dias que correm e, considerando todo o panorama histórico e actual das sociedades ocidentais, duma maneira geral, a corrupção, ganância e egoísmo parecem prevalecer, sob o desejo/necessidade/vontade de contribuir de forma generosa para o desenvolvimento da comunidade em que se está inserido. E mais do que prevalecer, a famosa greed de que Gekko falava parece vencer num mundo cada vez mais subjugado ao poder do capital, em que se vende o que de mais precioso existe: o tempo.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Before Sunrise




Recordo-me de me apaixonar por este filme à primeira vista.
Nunca o esqueci e, embora já não o experiencie há uns anos, é uma película à qual voltei muitas vezes e que ficou marcada cá dentro de forma especial.
O encontro entre duas pessoas é retratado de forma encantadora e apaixonante, sendo as personagens belissimamente interpretadas por Ethan Hawke e Julie Delpy.
Poderá um encontro casual entre duas pessoas, durante apenas um breve momento, mudar o resto das suas vidas? Eis a promissora premissa do filme.
Os protagonistas encontram-se num comboio (lugar já de si carregado dum romantismo único), proporcionando-se que a noite (que se avizinha) seja passada a explorar Viena.
Há quem sinta que há lugares mágicos, há quem sinta que são as pessoas que fazem os lugares; mas talvez seja no encontro entre estas duas crenças que nasce a magia.
Viena é uma das cidades mais majestosas e belas da Europa. Ao longo do filme os carismáticos protagonistas vão percorrendo diversos pontos míticos da cidade, à medida que a conversa flui de forma cada vez mais e mais intensa. A simbiose entre a imagem e o som, entre o lugar que enquadra o acontecimento e o fluir da conversa, é duma perfeição esmagadora. Há momentos únicos ao longo do filme, carregados duma simplicidade que transmite de forma perfeita a cumplicidade das personagens, nomeadamente o telefonema ou a cabine musical.
O filme transmite toda a imponência da imprevisibilidade, através dos acontecimentos, temáticas abordadas e pessoas que se vão cruzando com a história. Respira-se também um certo misticismo desde o poeta de rua à cigana vidente.
A grandiosidade do filme revela-se sobretudo na sequência final. A câmara mostra cada um dos locais que anteriormente estavam recheados de risos, conversas e segredos. Imagem após imagem percorremos cada um dos cenários que adornaram a história, cada um dos recantos por onde os protagonistas haviam passado há apenas instantes, como se, após essa vivência que testemunhámos, cada um desses lugares (agora vazios) ganhasse vida própria.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Seldom Awakens


"I'll miss the sea, but a person needs new experiences. They jar something deep inside, allowing him to grow. Without change something sleeps inside us, and seldom awakens. The sleeper must awaken."
Duke Leto Atreides (Jurgen Prochnow) - Dune

domingo, 16 de outubro de 2011

Passeio de Bicicleta: Butch Cassidy and The Sundance Kid



Um dos momentos mais hilariantes do cinema.
Paul Newman e Katharine Ross protagonizam uma das cenas mais emblemáticas de Butch Cassidy and The Sundance Kid ao som da memorável Raindrops Keep Fallin’ On My Head.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Jeux D'Enfants



Em inglês chamaram-lhe Love Me If You Dare e em português Amor Ou Consequência.
Recordo-me de arrastar dois grandes amigos meus para irem ao cinema ver esta película. 
Um dos filmes mais originais e deliciosos que experiencei. A premissa é aliciante: duas crianças e uma caixa: quem a possui desafia a outra a realizar uma determinada tarefa. Julien e Sophie (brilhantemente interpretados por Guillaume Canet e Marion Cotillard) vão crescendo agarrados a esse jogo insano, que se vai tornando cada vez mais obsessivo e desafiante.
À medida que o grau de exigência aumenta, parecem tornar-se mais dependentes da caixinha de surpresas.
Este filme tem uma das sequências mais geniais a que alguma vez assisti. Existe um determinado período de tempo durante o qual os protagonistas não se vêem (e em que (como em todos os filmes) esse tempo se resume a uns segundos com uma musiquinha). Após esses instantes cinematográficos (longos e arrastados momentos na vida real) Julien relembra tantas e tantas coisas que se passaram nesse tempo, tantas e tantas coisas que povoaram a sua vida, tantas e tantas coisas que fez, tantos e tantos pensamentos que teve, tantas e tantas sensações que sentiu; toda uma amálgama de acontecimentos que teve lugar durante esse período de tempo. Porém, e apesar de tudo o que viveu, apenas nesse momento, nesse precioso instante em que entrou de novo no jogo sente que está de novo a viver. Sente-se vivo, como não sentia desde o último desafio. Agora percebe que toda essa panóplia de momentos acumulados a que se resumia a sua vida eram apenas uma distracção, na imperturbável espera até esse instante em que se sentia despertar do sono profundo que vivera todo esse tempo. No fundo sabia-o, mas agora sente-o, em todas as suas veias, em todos os seus poros, com toda a força que o atravessa. E essa sensação é magnificamente transmitida pelo filme. Essa sensação que assalta Julien de que só esse momento importa, como se o ontem e o amanhã não existissem, nunca tivessem existido. Como se só naquele momento se sentisse verdadeiramente em comunhão com a vida e o universo. É uma cena duma intensidade feroz. Há momentos assim: em que tudo o que interessa se nos oferece. Momentos em que todos os passos anteriores parecem apenas servir para culminar nesse instante. Momentos em que o que sentimos se sobrepõe ao que pensamos, porque em última instância apenas isso importa, em última instância; como dizia esse magnífico poeta que Pessoa criou e baptizou de Ricardo Reis:

“O meu olhar é nítido como um girassol. 
Tenho o costume de andar pelas estradas 
Olhando para a direita e para a esquerda, 
E de, vez em quando olhando para trás... 
E o que vejo a cada momento 
É aquilo que nunca antes eu tinha visto, 
E eu sei dar por isso muito bem... 
Sei ter o pasmo essencial 
Que tem uma criança se, ao nascer, 
Reparasse que nascera deveras... 
Sinto-me nascido a cada momento 
Para a eterna novidade do Mundo... 

Creio no mundo como num malmequer, 
Porque o vejo. Mas não penso nele 
Porque pensar é não compreender... 

O Mundo não se fez para pensarmos nele 
(Pensar é estar doente dos olhos) 
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo... 

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos... 
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é, 
Mas porque a amo, e amo-a por isso, 
Porque quem ama nunca sabe o que ama 
Nem sabe por que ama, nem o que é amar... 
Amar é a eterna inocência, 
E a única inocência não pensar...”

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

The Tree Of Life


A aceitação é a chave de tudo. Embora esta frase simples seja aparentemente fácil de compreender e realizar é talvez o grande dilema com que nos debatemos até ao último instante.
Mallick traz-nos com esta obra-prima mais um poema em forma de filme, alternando imagens de infinita beleza dum universo profundamente imprevisível e poderoso, com a história duma família, que nos leva ao questionamento do nosso próprio percurso, do sentido do todo, da casualidade do mundo e do poder da natureza. Há nitidamente duas forças antagónicas sobre as quais o universo assenta: a natureza e a graça, sendo cada uma representada por um dos progenitores da família (encantador trabalho de Jessica Chastain e Brad Pitt).
Há aqui um desespero face à vida, no confronto com o percurso que ela própria vai desenhando para atravessarmos. Uma sensação de inutilidade no todo: nos pequenos dramas diários, nas grandes alegrias, na rotina sufocante, no conjunto da existência. Há, simultaneamente também, a sensação de dádiva do dia-a-dia, como se cada novo amanhecer fosse algo único provocado pela casualidade que pode ou não vir a repetir-se.
Deus estará porventura no silêncio, na aceitação, na luz. A luz que nos guia e que existe em cada um de nós, frequentemente sufocada pela escuridão a que nos reservamos. Talvez porque essa mesma luz é também ela um reflexo da fugacidade de tudo, que o Homem, como ser pensante, tem dificuldade em aceitar – recusa essa certeza apoteótica.
A permanência é quase uma necessidade intrínseca da condição humana e a libertação é alcançada com a (difícil e dolorosa) aceitação da árvore da vida.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Os Solitários Do Cinema



Os solitários do mundo cinematográfico apaixonam-nos: temos o eterno James, o divertido Indy, o ganancioso Gordon, o mafioso Michael, o politicamente incorrecto Tony, o aparentemente carrancudo Don, o resistente John, o atormentado Brick, o insubordinado Luke, entre muitos e tantos outros que povoam desde sempre o nosso imaginário.
É no seu cepticismo, na sua descrença que o mundo se revê. Personagens de carácter incerto e de falsa seriedade, interrompida frequentemente, pelo certeiro (e algo cínico) sentido de humor acutilante.
O solitário tem fantasmas, tem segredos, não sabe quem é, mas tenta descobri-lo (um pouco mais) na interacção com os que o rodeiam. E, afinal, o que é a vida senão isso? O que é a vida senão descobrirmo-nos, constantemente, no contacto com os outros? Socializar: veículo único de chegarmos ao fundo de nós próprios e, em antítese, expoente máximo de solidão. É no olhar dos outros que nos revemos ou nos ausentamos. É no reflexo desse olhar que vemos o conforto dum espelho ou a crueza duma parede. É algo de que, simultaneamente, se depende e se abomina. E é nesse curioso jogo que o solitário se revela, um pouco mais, a quem realmente importa: ele próprio.