segunda-feira, 19 de março de 2012

Paris Texas


Wenders é um dos realizadores mais singulares da sétima arte. Os seus filmes são dum lirismo apaixonante e este emblemático Paris Texas é um exemplo disso mesmo.
Paris Texas é um filme sobre a ausência, sobre o regresso, sobre a partida, sobre a busca, sobre o reencontro, sobre os sentimentos, sobre a dicotomia homem/mulher, sobre os laços de sangue, sobre as coisas que podemos ocultar do mundo todo, mas não podemos negar a nós próprios.

Será possível entregarmo-nos ao amor sem negarmos a nossa própria liberdade? Até que ponto podem duas pessoas estar tão próximas sem que se sobreponham uma à outra? Sem que a razão de viver duma passe do seu próprio centro para o umbigo doutra pessoa? Será possível que na fusão de corpo e alma com alguém não abdiquemos um bocadinho de nós?

Paris Texas é também sobre o afastamento, o desespero e a solidão. É sobre a melancolia provocada pelo afastamento, mas também sobre o desprendimento que só o tempo consegue dar. Um desprendimento e ligeireza que são apenas exteriores, na maneira de se lidar com os sentimentos viscerais, porque o apego interior continua, o enternecimento torna-se mais real e sentido, simplesmente fica adormecido pelas idiossincrasias da vida, pela apatia que a vida traz.
E, acima de todos estes temas, é sobre o reencontro. Há reencontros que acontecem porque a vida assim o quis, outros que acontecem porque as pessoas os procuram e outros que simplesmente não acontecem. Mas as pessoas que se reencontram são sempre diferentes das pessoas que existiam antes, das pessoas que estavam encontradas outrora. Porque as pessoas renovam-se continuamente no incessante movimento diário e tal como há pessoas que parece que nem se afastaram por um segundo (mesmo que passem vidas e vidas), há afastamentos que são irrecuperáveis.

Ou nas magníficas e elucidativas palavras de Alçada Baptista no genial O Riso De Deus:
"...tu és um ser singular e a tua singularidade não pode sobrepor-se à minha. Muitas vezes parece que isso pode acontecer e as mulheres, sobretudo, têm uma capacidade de doação que as faz quase desistirem de si próprias para seguirem o caminho que um homem vai traçando com a sua singularidade para não dizer com os seus caprichos. Às vezes penso que o amor humano é um estímulo para termos um grande enternecimento com o mundo porque eu não sei se será possível lançar sobre alguém o nosso fogo interior sem que isso nos tire a liberdade.”

Será que a liberdade e o amor são inconciliáveis ou será o amor que nos dá a liberdade?

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