quarta-feira, 14 de março de 2012

Florbela


Florbela Espanca é um dos maiores vultos da literatura portuguesa.
A literatura portuguesa é particularmente rica em poesia e esta poeta foi uma das maiores nessa arte.

"Os poetas são como toda a gente sabe seres de utopia. Essa utopia sem a qual não há progresso."
Eugénio de Andrade

Florbela é um enternecedor e competente filme de Vicente Alves do Ó que acompanha a entrada no terceiro casamento de Florbela e o reencontro com o seu irmão Apeles.
Apesar de alguns tremeliques desnecessários da câmara numa ou outra cena, o argumento é sublime e os actores são supremos, tornando este filme uma obra apaixonante - palavra especial para Dalila Carmo que dá vida de forma soberba a essa complexa e contraditória mulher.

Bela sofria dum mal de que sofrem muitos seres humanos, particularmente as mulheres. Um mal que nas perfeitas e sintéticas palavras de António Alçada Baptista em O Riso De Deus se resume a:

“Tu terás de descobrir que o homem da tua vida, o outro que te provoca para a aventura de viveres e te conheceres, afinal está dentro de ti e é com ele que tu terás de procurar a tua unidade e a imersão no mistério de viver. Os outros, talvez sejam só os nossos companheiros de jornada que nos podem ajudar e acarinhar mas com quem não podemos criar dependências numa coisa tão importante como é a descoberta do sentido da vida.”

É essa dependência dos seres humanos que nos rodeiam que nos dá vida e nos mata.
Florbela era um espírito inquieto, numa incessante busca, com sede e fome de infinito, uma tentativa de "condensar o mundo num só grito". Há pessoas assim: incansáveis na sua busca interminável de condensar o mundo, de se fundirem com a vida. São naturalmente seres incompreendidos e agitados.

Quando escrevi sobre o Extremely Loud & Incredibly Close referi que o protagonista conclui que é melhor uma desilusão do que nada. E tal verifica-se porque o conhecimento é uma dádiva. E é melhor conhecer do que desconhecer. Frequentemente se diz que os desconhecedores são mais felizes na sua inocência ou inconsciência forçada. Tal poderia ser verdade sob os padrões de felicidade dos "conscientes", mas como os padrões são diferentes não há comparação possível. Quem não sabe é como quem não vê. Por isso o sabedor, embora lhe seja mais dificil atingir uma felicidade ou uma existência tranquila, quando a atinge consegue níveis elevados, porque reconhece o seu valor e se a atinge apenas por instantes (como é frequente neste tipo de pessoas), esses instantes são mais recheados de intensidade do que vidas inteiras. E, por isso, gosto de pensar nestes seres de clarividência como seres alegres na sua eterna melancolia provocada pela incessante angústia do drama de se procurar respostas que se sabe não existirem: a grande utopia dos poetas.
Ou nas próprias palavras desta grande senhora "sou a que chamam triste sem o ser":

"Eu sou a que no mundo anda perdida,
Eu sou a que na vida não tem norte,
Sou a irmã do Sonho,e desta sorte
Sou a crucificada ... a dolorida ...

Sombra de névoa tênue e esvaecida,
E que o destino amargo, triste e forte,
Impele brutalmente para a morte!
Alma de luto sempre incompreendida!...

Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...

Sou talvez a visão que Alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!"

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