segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

An Organ Of Fire


"Betrayals in war are childish compared to the betrayals in peace. New lovers are nervous and tender, but smash everything, for the heart is an organ of fire."
Lazlo de Almasy (Ralph Fiennes) - The English Patient

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Hugo

"Depois de em 1995 nos ter levado numa viagem pessoal pelo cinema americano, e de em 1999 o destino ter sido o cinema italiano, Scorsese convida-nos para uma terceira viagem. Desta vez vamos até Paris. E porquê Paris? Porque foi lá que nasceu o Cinema.
O filme abre com uma prodigiosa sequência, que nos faz sobrevoar a cidade-luz, entrar na estação onde decorrerá grande parte da acção, percorrê-la a grande velocidade, e encontrar o protagonista, Hugo Cabret (Asa Butterfield). Hugo tem 12 anos, é órfão, vem de uma família de relojoeiros, tem um talento natural para tudo o que seja mecânico e faz a manutenção de todos os relógios da estação. Hugo vive entre as suas paredes, nos seus lugares mais recônditos, e surge-nos escondido atrás de um dos relógios, observando sem ser observado, atento aos movimentos dos habitantes frequentes (lojistas) e ocasionais (passageiros) da estação. Numa atitude voyeurista que nos revela desde logo o tema principal do filme – o Cinema.
Estamos no início do século XX, no final dos anos 20. A Primeira Guerra Mundial é ainda uma ferida bem aberta. O Cinema é já uma realidade, produziu os seus primeiros heróis. Passaram-se cerca de 30 anos desde a primeira apresentação pública de Cinema, pelos irmãos Lumière. A sala escura tem já os seus primeiros aficionados, os primeiros cinéfilos, e Hugo é um deles. O pai de Hugo (Jude Law) apaixonou-se pela imagem em movimento desde que viu “La Voyage Dans La Lune”, um filme de 1902, do parisiense Georges Méliès. E partilhou com Hugo essa paixão, levando-o frequentemente ao Cinema, fazendo dessa partilha um dos alicerces da sua relação.
O pai de Hugo encontrou, no museu onde trabalhava, um misterioso autómato, um ser mecânico, que levou consigo. Depois da sua morte, Hugo abraça a tarefa que anteriormente partilhava com o pai – reparar o autómato, trazer de novo à vida o ser mecânico, revelar a mensagem que ele esconde. Um dos lojistas da estação, de nome Georges (Ben Kingsley), torna-se o seu maior adversário nessa missão, por razões que Hugo desconhece, apoderando-se de um caderno que contém informação preciosa.
Hugo vai encontrar uma preciosa aliada – Isabelle (Chloë Grace Moretz), também órfã, adoptada por Georges e pela sua mulher Jeanne (Helen McCrory) – que se torna sua companheira de aventuras. Isabelle nunca foi ao Cinema, um mal que Hugo se apressa a remediar. Não podendo comprar um bilhete, Hugo transporta Isabelle, clandestinamente, para a sala onde nascem os sonhos. Harold Lloyd subindo uma torre e pendurando-se nos ponteiros de um relógio, no filme “Safety Last!” (1923), são as primeiras imagens que Isabelle vê numa sala de cinema, fascinada.

Em contrapartida, Isabelle conhece um outro lugar mágico (mistura de “Ilha do Tesouro”, “Oz”, e outros locais fantásticos, nas palavras da própria Isabelle), que vai apresentar a Hugo - a livraria de Monsieur Labisse (Christopher Lee). Isabelle é uma ávida leitora, e Monsieur Labisse é o seu cúmplice.
O mundo de Hugo é pintado com cores frias. Na Paris que ele observa está sempre noite. Os lugares que ele habita são escuros, frios, sujos. É uma paisagem industrial, os fumos das caldeiras e das canalizações são omnipresentes. Hugo move-se entre peças e mecanismos de relógios, com as suas ferramentas. Vive na Paris dos anos 20 do século XX, mas parece ter saído dos livros de Charles Dickens. Pela estação circulam outros órfãos, que trabalham desde muito cedo, mendigam ou roubam, tentando fugir a uma alternativa que se lhes apresenta ainda mais hostil – o orfanato. O inspector da estação, Gustav (Sacha Baron Cohen), também ele crescido num orfanato, persegue impiedosamente as crianças que vagueiam sozinhas, para as entregar a esse destino indesejado. Gustav é uma ameaça constante para Hugo.
A estação que Hugo observa, escondido atrás dos mostradores dos relógios é, em contrapartida, pintada com cores quentes. Os passageiros circulam, apressados e indiferentes. Os lojistas, como a florista Lisette (Emily Mortimer), vivem preguiçosamente a sua rotina, entediados, entre baguettes, croissants, flores, um fumo que não é de caldeiras, e sim de cigarros, mas continua presente, e pequenos romances que timidamente os desviam dos gestos repetidos todos os dias.
E é neste universo, e através destas personagens, que assistimos a uma das mais belas homenagens alguma vez feitas ao Cinema. É sobretudo de Cinema que se fala neste filme, desde a já referida primeira sequência (que cita “Goodfellas”, um filme de Scorsese de 1990), até ao seu último segundo.
Georges folheia rapidamente o caderno que contém instruções sobre o autómato, e os desenhos inscritos nas suas páginas ganham vida. E nós assistimos à ilusão da imagem em movimento, tal como criada na era pré-Lumière. Somos também conduzidos até ao salão do Grand Café de Paris, para fazermos parte de uma das primeiras sessões públicas de Cinema, e vermos como o público reagiu assustado ao ver no écran o comboio que chega à estação de La Ciotat. São-nos apresentados excertos de filmes de Charlie Chaplin e Buster Keaton. Hugo pendura-se nos ponteiros do relógio da estação, imitando o que viu Harold Lloyd fazer, quando sorrateiramente entrou com Isabelle na sala de Cinema. E assim se homenageiam os pioneiros da Sétima Arte, e se introduz a figura central deste filme, o primeiro grande cineasta – Georges Méliès.
Scorsese disse, em entrevista de promoção, que tudo o que é feito agora em Cinema, já Méliès fez antes. E o tributo é-lhe prestado neste “Hugo”, em que percorremos a sua história pessoal, incluindo o seu passado como mágico e a sua descoberta do Cinema, a sua obra, o seu estúdio (que foi reconstituído para este filme), os seus métodos e ilusões (podemos ver Méliès a filmar e a montar as suas películas). E também a forma como começou a conquistar o coração e a imaginação das primeiras pessoas que viram filmes, como deu origem aos primeiros cinéfilos.

A segunda figura central neste filme é o cinéfilo, personificado principalmente (embora não exclusivamente) por René Tabard (Michael Stuhlbarg). René Tabard é um estudioso da obra de Méliès, por quem foi conquistado em criança, altura em que o viu em acção no seu estúdio e assistiu aos seus filmes. A sua paixão torna-o no guardião de objectos, filmes e da memória do seu adorado realizador, mesmo quando, após a Primeira Guerra Mundial, todos já o esqueceram. E, depois do seu encontro com Hugo e Isabelle lhe trazer novas informações sobre Méliès, irá encontrar e restaurar mais filmes. E exibi-los, trazê-los de novo para as salas, resgatá-los a um destino de esquecimento que parecia inevitável. E, inevitavelmente, lembramo-nos do próprio trabalho, incansável e apaixonado, de Scorsese na descoberta, recuperação, e divulgação de velhas películas. Scorsese aparece-nos, ele mesmo, no filme, por breves instantes, como fotógrafo. Mas Scorsese, neste filme, é René Tabard.
O Cinema aparece-nos também neste “Hugo” enquanto tecnologia e enquanto tempo. Os mecanismos das máquinas que filmam e que projectam, criando a ilusão da imagem em movimento, são-nos explicitamente mostrados, e misturam-se com os dos relógios e do autómato. Os dispositivos mecânicos e os relógios são uma presença constante neste filme. E tornam omnipresente esta ideia de mecanismo e de movimento perpétuo e de tempo. Tempo e movimento, que são duas outras características do Cinema.

E o Cinema como magia e emoção. O Cinema como ilusão, em que imagens fixas parecem estar em movimento. O passado de Méliès como mágico e o presente de Hugo com os seus truques de cartas. A emoção que o Cinema provoca em quem o vê. A experiência de assistir a um filme numa sala de Cinema é justamente exaltada na cena em que Hugo e Isabelle penetram naquele mundo mágico para ver Harold Lloyd.


E, finalmente, a literatura como inspiração para os filmes. Na livraria de Monsieur Labisse, personagem interpretada por Christopher Lee, cuja presença neste filme é, por si só, uma referência e homenagem cinéfila, Hugo encontra Robin Hood, e refere ter visto o filme (de 1922, com Douglas Fairbanks). E já antes Isabelle se tinha referido à livraria como um mundo de fantasia, como “Oz” ou “A Ilha do Tesouro”, que foram, mais tarde, adaptados ao Cinema. É um mundo de magia que contagia o outro. E o misterioso autómato tem o poder da escrita, revelando dessa forma alguns dos segredos deste filme.
Mas é só sobre Cinema que Scorsese nos fala com este seu “Hugo”? Não, este filme tem um segundo grande tema. O que é que nos torna humanos, e nos distingue dos autómatos, dos dispositivos mecânicos?
Os adultos que povoam este filme, e que vivem e circulam no exterior da estação, apesar de pintados com cores quentes, são, paradoxalmente, seres tristes. Os lojistas vivem um dia-a-dia de rotinas, de aborrecimento. Vemo-los junto às suas bancas, às suas lojas, mas os passageiros nada compram, não estabelecem contacto com eles. E, apesar da vontade, dos tímidos “flirts”, uma barreira invisível impede-os de comunicar. Os passageiros que circulam na estação são como autómatos.
Numa cena muito importante do filme, Isabelle cai, e as pessoas que circulam continuam a andar, ignorando-a, e quase a pisando, indiferentes e apressados. São controlados pelos omnipresentes relógios, e são eles próprios peças de um mecanismo. Hugo, numa outra cena, diz que vê, por vezes, o mundo como um gigantesco mecanismo de que todos fazemos parte, e em que todos desempenhamos uma função. A Primeira Guerra Mundial terminou há pouco, deixando profundas marcas. O Cinema, recentemente criado, e Méliès, o seu principal artesão, foram já esquecidos por estes autómatos de carne e osso que entram e saem dos comboios. Não há lugar para a magia nas suas vidas.
Tudo é diferente no mundo mais escuro e frio de Hugo e Isabelle. É lá, curiosamente, que sobrevive a magia. Eles comunicam e colaboram, dão as mãos, partilham sonhos e aventuras, perseguem objectivos que vão para além da mera função que lhes está destinada como peças de uma engrenagem. Hugo faz a manutenção dos relógios mas a sua vida não é controlada por eles, repara dispositivos mecânicos mas não é um deles. E o ser mecânico que vive com Hugo, apesar de composto por molas e rodas dentadas, é a sua companhia, de que Hugo desesperadamente necessita (referindo-o explicitamente), apesar de viver numa estação cheia de pessoas. Vemos como o autómato (inspirado por Pinóquio e visualmente inspirado por “Metropolis”?) “olha” para Hugo enquanto ele dorme, como o parece proteger. E o carinho que Hugo lhe devota, arriscando até a sua vida para o salvar dos carris.


Basta ser feito de carne e osso para ser humano? Ser feito de molas e rodas dentadas é o suficiente para não o ser? Este é um tema já tratado, de forma mais profunda, na literatura e no Cinema. O escrito Philip K. dick debruçou-se demoradamente sobre este assunto, e uma adaptação de uma obra sua ao Cinema, pelas mãos de Ridley Scott, resultou no magistral "Blade Runner" (a comemorar em 2012 o seu trigésimo aniversário). Nem "Hugo" nem "Blade Runner" arriscam uma resposta definitiva, mas dão-nos importantes pistas para reflexão. E sugerem uma resposta.
O que pode então tornar mais humanos aqueles autómatos de carne e osso que vivem e circulam na estação? Este “Hugo” sugere-nos que o caminho passa, entre outras coisas, como o amor e a amizade, pela recuperação da memória perdida, pela literatura, pela magia, pela cinefilia. Em resumo, pelo Cinema. E assim temos a ligação entre os dois temas do filme.
“Hugo” surge, curiosamente, em simultâneo com duas outras importantes homenagens aos pioneiros do Cinema, e ao filme mudo – “O Artista” (Michel Hazanavicius, 2011) e “Tabu” (Miguel Gomes, 2012). Apenas uma coincidência? Ou este novo período de transição na história do Cinema, com o fim da película, e todos os desafios que se colocam com os “downloads” gratuitos de filmes, trouxe, consciente ou inconscientemente, a necessidade de recordar as origens?
“A Invenção de Hugo” é um filme belíssimo, com uma fotografia deslumbrante, e uma das melhores utilizações de sempre do 3D. É uma declaração apaixonada dirigida ao Cinema, aos seus pioneiros, a todos os que o fazem hoje, e aos cinéfilos. Endereçada pelo maior cinéfilo de todos, o maior de sempre, o “mestre” Martin Scorsese. Fica ao lado, ou mesmo acima, de “Cinema Paradiso”, como um dos grandes filmes sobre a cinefilia e o próprio Cinema.

Título em português: A Invenção de Hugo
Título original: Hugo
Realização: Martin Scorsese
Produção: Martin Scorsese, Johnny Depp
Argumento: John Logan e Brian Selznick, adaptando o livro “A Invenção de Hugo Cabret”, de Brian Selznick.
Elenco: Ben Kingsley (Georges), Asa Butterfield (Hugo), Chloë Grace Moretz (Isabelle), Sacha Baron Cohen (Gustav), Emily Mortimer (Lisette), Christopher Lee (Monsieur Labisse), Helen McCrory (Jeanne), Michael Stuhlbarg (René Tabard), Jude Law (pai de Hugo).
Cinematografia: Robert Richardson
Montagem: Thelma Schoonmaker
Música: Howard Shore
“Hugo” é a vigésima segunda longa-metragem de ficção em quase 70 anos de vida, e 44 de carreira, de Martin Scorsese. Martin Scorsese realizou filmes como “Taxi Driver”, “Raging Bull” e “Goodfellas”.
É a primeira adaptação ao Cinema de um livro de Brian Selznick, que assina também o seu primeiro argumento.
O protagonista Asa Butterfield tem a sua quinta aparição no Cinema, tendo já participado em filmes como “O Rapaz do Pijama às Riscas” e “Nanny McPhee e o Toque de Magia”.
A protagonista Chloë Grace Moretz tem já o seu décimo oitavo papel no Cinema, tendo anteriormente protagonizado a versão americana de “Deixa-me Entrar”.
Sir Ben Kingsley atinge com este filme as 56 participações no Cinema, sendo “Gandhi” o seu momento mais alto. É a segunda colaboração com Martin Scorsese, depois de “Shutter Island”.
Carlos Rui Ribeiro 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Vertigo



Vertigo foi, recentemente, o vencedor da lista organizada pela Sight and Sound (publicação britânica que a cada dez anos reúne inúmeras pessoas de diversas áreas relacionadas com a sétima arte para elegerem os filmes que consideram mais marcantes na história do cinema). Nesse sentido, é uma lista mais de consensos do que propriamente de filmes do coração. Digamos que este foi o filme que mais eleitores mencionaram, destronando assim Citizen Kane de Orson Welles, em primeiro há cinco décadas. Não será então por acaso que a obra foi reposta nas salas de cinema, sob o epíteto de o melhor filme de todos os tempos. Que bom para nós que pudemos ver (ou rever) este filme de referência, na magia do grande ecrã, sobretudo numa época do ano em que sabe tão bem voltar aos clássicos.

Em português chamaram-lhe A Mulher Que Viveu Duas Vezes, título este que é exemplificativo das enormes aberrações que se cometem, por vezes, no campo das traduções cinematográficas, revelando uma enorme falta de imaginação e, eu diria até, uma ofensa ao autor. Note-se que o nome original está intrinsecamente ligado a uma característica duma das personagens (que indirectamente influencia as que o rodeiam) e o título português relega essa personagem para segundo plano, dando relevância a outros acontecimentos (que têm a sua importância, mas não são a razão de ser de todo o enredo).

O Mestre Hitchcock é um realizador dum talento notável, autor de filmes cheios de personalidade. Facilmente se reconhece uma obra sua e pode-se dizer que todas elas - ou mais divertidas ou mais negras - estão repletas de mistério. 
Vertigo é um filme que se destaca dos restantes, não por falta de mistério, mas pela maneira como esse mesmo mistério se adensa e é conduzido até à revelação. 

Trata-se dum filme de elevada qualidade em que as brilhantes interpretações de James Stewart e Kim Novak sobressaem. Este é, aliás, o papel mais emblemático que Novak desempenhou, envolto num misticismo, derivado sobretudo da sua contenção e do desconforto subjacente à personagem. Já Stewart, igual a si próprio, é aqui um herói em decadência, diminuído por uma limitação e derrubado por uma obsessão.

Vi-o há muitos anos e não me recordava do desfecho. Ao rever, tive o esperado dejá vu e questionei-me como aqueles momentos finais se me apagaram, pois estamos perante um desenlace difícil de esquecer. Possivelmente eclipsei-o da minha memória, por o achar um pouco macabro e com uma certa melancolia subjacente. Esse sabor mantém-se. Reconheço a genialidade do filme e a originalidade deste título no universo de Hitchcock, no entanto, tenho enorme dificuldade em simpatizar com o todo. Vejo uma vez, rendo-me aos encantos de Novak e à amargura de Stewart, mas não é obra que tenha vontade de rever. O final é amargo (ou no mínimo agridoce) e dificilmente alguém sai do cinema com uma sensação animadora.  Apesar destes sentimentos, não consigo imaginar outro remate: este assenta que nem uma luva no filme em questão, culminando assim todo o desconforto e morbidez do filme que fecha; mantendo, no fundo, a vívida personalidade do filme e contribuindo para o leque de vertiginosas cenas memoráveis desta obra. 

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Cloud Atlas


É importante começar por referir que este complexo romance foi adaptado por três realizadores sui generis: Lana Wachowski, Andy Wachowski e Tom Tykwer. E o que consta do curriculum deste trio? Os irmãos Wachowski realizaram um dos filmes de referência do século passado: The Matrix. Realizaram também os dois volumes seguintes dessa saga, mas se o deveriam ou não ter feito já é outra história. Tykwer realizou, entre outros, a belíssima e difícil adaptação do best-seller de Patrick Suskind: Perfume: The Story Of A Murder. Quer no caso de Matrix, quer no de Perfume, o argumento foi escrito pelos realizadores (Tykwer em conjunto com Bernd Eichinger e Andrew Birkin).

Posto isto é natural que a expectativa em relação a Cloud Atlas fosse muito elevada, para além da curiosidade inerente à adaptação cinematográfica dum livro desta natureza.
O argumento foi adaptado pelo trio, com toda a confiança depositada pelo autor (David Mitchell), que refere em entrevistas que estes realizadores são pessoas mais do que competentes e experientes na arte de adaptação, de modo que não sentiu qualquer necessidade de interferir.
De facto, imagino que o romance seja bastante complexo e, nesse sentido, considero a adaptação cinematográfica bem conseguida (embora apenas quem leu o livro possa dar uma opinião mais fidedigna neste campo).

Cloud Atlas é um filme marcante que capta o espectador desde o primeiro instante. Temos não uma, mas diversas histórias interligadas. "We are bound to others." Cada história ocorre num determinado período de tempo e vamos avançando ou recuando de acordo com o desenrolar de cada uma.
Temos um elenco versátil e talentoso. Somos captados desde o primeiro instante pelos dramas, risos e mistérios que se nos apresentam.

Gostei particularmente da história do compositor. A magnífica interpretação de Ben Whishaw (que já havia colaborado com Tykwer em Perfume) é notável, tal como é apaixonante todo o percurso da personagem: a sua força, a sua coragem, a sua maneira de viver. A sequência final desta história é duma beleza ímpar, com a voz em modo off do actor a revelar pensamentos dignos de nota, acompanhando uma série de imagens de rara poesia.

E parafraseando Sonmi-451: "From womb to tomb, our lives are not our own. We are bound to others. Past and present. And by each crime; and every kindness we birth our future".

Um filme imperdível pela qualidade, originalidade e, sobretudo, pelas ideias subjacentes, tão verdadeiras e intemporais.

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Life Of Pi

                                              

Ang Lee sempre nos deslumbrou com os seus universos introspectivos, em que a natureza tem um lugar preponderante - ou até mesmo decisivo.

Pi é desde logo um menino particular, por ter nascido num lugar especial, que influenciará de maneira inimaginável a sua vida. A sequência inicial do filme é brilhante, com deliciosas imagens que nos assaltam com o seu exotismo e singularidade.

Pi, como quase todos nós, anda em busca de si próprio e será confrontado consigo mesmo nas extremas condições em que se verá submergido. Essa viagem fantástica e espiritual que marcará a sua vida, é deslumbrante não só pela maneira como transforma a personagem, como também pelos insólitos seres que o acompanham e pelo assombroso cenário em que esta ocorre.

Não sou fã da imagem 3D, embora em determinados casos reconheça que é uma experiência digna de registo.
Louvo o cinema: permite-nos viajar para locais inóspitos, observar imagens de infinita beleza e rara ocorrência, que dificilmente estariam ao nosso alcance.

Life Of Pi é uma apaixonante experiência, que não deixará ninguém indiferente.

domingo, 23 de dezembro de 2012

Anna Karenina


Um dos maiores livros de sempre, obviamente teria de ser transposto uma vez mais para cinema.
Obra maior da literatura mundial, escrita pelo genial Tolstoi, Anna Karenina é uma história dramática e trágica, como todos os grandes russos.
Karenina é uma mulher forte, corajosa, desinibida e, acima de tudo, sincera, sobretudo, consigo própria.
Joe Wright pega neste pesado romance e torna-o leve, dum modo inesperado e agradável. Toda a história é acompanhada de forma original e a maneira como somos transportados de sequência em sequência retiram o pesado fardo da tragicidade latente.
O filme conta com brilhantes interpretações, com destaque para Keira Knithley.
Karenina conta a história duma mulher do seu tempo, história essa obsoleta na civilização ocidental dos dias actuais (no que ao plano objectivo diz respeito). Já no subjectivo, a história é outra, quer os comentários, quer os crescentes ciúmes de Anna são tão reais hoje, como ontem.
Anna Karenina é e será sempre uma das histórias de referência mundial, às quais é sempre bom voltar. E esta adaptação é uma agradável viagem, competente no seu propósito.
Não temos um filme grandioso, mas temos uma adaptação interessante duma obra grandiosa.

sábado, 22 de dezembro de 2012

The Lord Of The Rings: The Return Of The King


O grande culminar desta aventura é celebrado num filme inesquecível.
Todos os momentos levam o espectador sedento de aventura em aventura até ao grande final.
Cenas memoráveis perduram na memória, como a arrepiante cena da aranha.

Recordo uns livros juvenis em que se decidia que passo dar a seguir. O próprio leitor era o herói e poderia escolher os caminhos a tomar ao longo da aventura. Este filme relembrou-me esse universo. Facilmente nos identificamos com a pacatez da vida dos hobbits, calmaria essa que é a paz no meio da loucura, os pequenos gestos corriqueiros como contraponto ao insuportável fardo. Nos momentos decisivos Frodo e Sam agarram-se a pedaços do lar que deixaram.
(Spoiler) Frodo desgastado prossegue até que, no momento final, é o vilão que se torna herói. É o vilão que involuntariamente atinge o objectivo. Por momentos, achamos que o nosso quebrado hobbit não resistirá.

"How do you pick up the threads of an old life? How do you go on when in your heart begin to understand there is no going back? There are some things that time cannot mend. Some hurts that go too deep, that have taken hold." Frodo Baggins

Destaque para Elijah Wood, Andy Serkins, Sean Astin e Viggo Mortensen.

Jackson estará eternamente grato a Tolkien por conceber esta história maravilhosa. E estou certa de que Tolkien estará grato a Jackson por a imortalizar na mais bela das artes.

The Lord Of The Rings: The Two Towers


Jackson continua esta façanha de transformar em cinema o mundo mágico de Tolkien.
A grande estrela deste filme é Smeagol/Gollum, que nos fascina e repudia a cada passo. O magnetismo da personagem é inegável. Impossível não sentir compaixão por tal criatura à medida que a vamos conhecendo. O trabalho de Andy Serkins é absolutamente genial, tal como o é todo o processo de criação deste ser, que à data tratava-se da mais avançada tecnologia (ainda hoje referência neste campo). Apenas o conflito entre tecnologia e realidade justifica a ausência de nomeações e prémios para esta interpretação descomunal. Gollum é apaixonante, tornando-se a personagem de referência de toda a saga.
Este capítulo mantém o elevado nível do anterior e abre-nos ainda mais o apetite para our precious sobremesa.

The Lord Of The Rings: The Fellowship Of The Rings


O primeiro acto é a introdução para este mundo de fantasia.
Já me referi exaustivamente - no The Hobbit - sobre esta magnífica criação de Tolkien, ilustrada por Jackson.
Não compreendo como nunca me debrucei sobre estes filmes antes. A magia é contagiante.
Neste primeiro capitulo soltam-se os feitiços para uma boa dose de emoções.
O elenco, brilhantemente escolhido, dá vida a esta história cativante, que nos vai enredando com o seu magnetismo.
(Spoiler) É formada a Irmandade do Anel e as personagens começam a ser reveladas. A tarefa que Frodo tem pela frente é mais árdua do que imagina, como demonstra a expressão de Gandalf no momento decisivo. Para além da força das interpretações (Elijah Wood, Ian McKellen, Viggo Mortensen e Sean Bean têm aqui um papel decisivo), também as variadas criaturas têm impacto no espectador. O grupo separa-se, mas o enredo torna-se mais apetitoso e aguarda-se o próximo petisco com água na boca.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

The Hobbit An Unexpected Journey


Confesso que nunca fui fã da saga Lord Of The Rings. Reconheço agora que tal se devia a mim e não à saga.
A receptividade do sujeito é mais importante do que a própria experiência. É a capacidade de absorção e a atenção que o observador devota a um determinado momento que transformam todo esse acontecimento em algo digno de registo.

Vi realmente o The Hobbit: An Unexpected Journey e absorvi este universo que Tolkien inventou e que Jackson transpôs para o grande ecrã de maneira magistral. Claro que esta obra literária é uma das histórias com maior potencial para transpor para o cinema, devido à envolvente em que se insere. E com os avanços tecnológicos os efeitos visuais e sonoros têm tudo para conferir maior realismo a este imaginário literário, como se as próprias palavras de Tolkien ganhassem vida em cada frame de Jackson. Menção especial para a apaixonante banda-sonora, nomeadamente a Misty Mountains interpretada pelo coro de anões.

Não sei como nunca tinha valorizado ou sequer me tinha interessado por esta saga antes, uma vez que todo este mundo de magia, com feiticeiros e guerreiros é um tema que me fascina desde a infância.

Fiquei extasiada com as paisagens, as personagens, a história. E este, supostamente, nem é o melhor de Tolkien (nem de Jackson). Obviamente fiquei cheia de vontade de (re)ver com olhos de ver os primeiros filmes (segundo volume da saga).

A Terra Média é um lugar mágico que dá vontade de explorar até ao último esconderijo, pois há sempre algo inesperado para nos surpreender.

E este filme foi uma viagem inesperada para mim.